Veja quantos alunos oriundos de escola pública há na UFPE

Confira, também os dados relacionados à UFRPE

por Rachel Andrade sex, 18/06/2021 - 15:57

Em 2012, foi decretada a Lei 12711, que determina a divisão das vagas disponíveis nas universidades públicas do País. Cinquenta por cento delas são voltadas para estudantes de escolas públicas, além dos autodeclarados pretos, pardos ou indígenas, e quem declara renda familiar de um salário mínimo, entre outros critérios. Quase dez anos depois da chamada Lei das Cotas, o cenário nas universidades públicas mudou, principalmente em relação ao perfil dos estudantes que ingressam e concluem o ensino superior.

Em Pernambuco, as principais universidades públicas apresentam números que comprovam a efetividade da lei. Na Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE) foram ofertadas 3.840 vagas pelo Sistema de Seleção Unificada (Sisu) 2021. Dessas, 1.920 vagas (50%) foram destinadas a egressos de escola pública.

Já na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), o levantamento mais recente aponta para os dados de 2019, com um total de 7.193 estudantes que ingressaram em cursos de graduação, sendo 3.625 (50,39%) que concluíram o ensino médio em escola privada e 3.568 (49,61%) ingressantes que finalizaram o ensino médio em escola pública.

A UFPE ainda aponta a trajetória da quantidade de estudantes cotistas desde o primeiro ano em que a Lei de Cotas entrou em vigor. Em 2013, entraram na Universidade 5.354 estudantes de escolas privadas e 1.682 de escola públicas. Apenas a partir de 2016 a proporção mudou, com 3.620 estudantes vindos da rede particular de ensino e 3.521 da rede pública.

Em 2017, pela primeira vez, a UFPE registrou mais universitários oriundos de escolas públicas (3.414) na comparação com os de unidades privadas (3.407). Na série histórica, de 2013 a 2019, a Universidade aprovou 28.235 estudantes vindos de escolas privadas e 21.761 de escolas públicas.

A visão de um universitário oriundo de escola pública

 Nos dados de 2016 da UFPE é possível observar que aproximadamente 50,7% dos estudantes aprovados vieram de escolas públicas. Um dos integrantes desse grupo é Antonio Vinícius de Jesus Pequeno, 27 anos, natural de São Paulo. Ele ingressou por meio da reserva L4 da Lei das Cotas, que prioriza estudantes vindos da rede pública que se autodeclaram pretos e pardos.

Estudante de publicidade, Antonio está no último ano da formação, e vê que não só sua entrada na universidade, mas sua permanência, é sinônimo de luta para ele e para sua família. “Entrar na Universidade para mim é uma vitória, uma luta muito grande que quando reflito, fico até triste pelo aspecto. Lembro que no ano que eu fiz o Enem, de 3 milhões de pessoas inscritas para a prova, só existiam vagas para 270 mil. Isso incluindo ProUni. É um número ínfimo. O acesso é claro, muito comemorado, mas sempre que alguém fala comigo, até como uma forma de elogio e falando que ‘fiz por merecer’, num sentido meritocrático, eu costumo falar que mesmo lutando tanto, ainda sou exceção, porque muitos que tentaram não conseguiram. E eu não sou melhor por ter acertado mais perguntas e ter tirado uma nota boa na redação, isso é um problema estrutural", acrescenta.

Aulas de publicidade são realizadas no Centro de Artes e Comunicação. Foto: Júlio Gomes/LeiaJáImagens/Arquivo

"E eu quis entrar em uma pública porque na minha família ninguém havia conseguido", ele relata. Diante da realidade em que se viu, mesmo feliz pelo ingresso no ensino superior, Antonio ainda encarou algumas dificuldades para garantir a permanência no curso. “Todo dia estar na Universidade é uma luta. Primeira situação foi vir de São Paulo, onde nasci e cresci a vida toda, me formei no ensino fundamental e médio em escola pública, para morar numa cidade que sempre tive vontade, mas não conhecia de forma alguma. No período que passei até adentrar no curso, que dá um período de uns seis meses, eu fui me informando com tudo que podia, sobre edital, auxílio, moradia. E então, assim que entrei, uma saga tão difícil quanto a vaga, foi buscar um auxílio, que depois de três meses na cidade consegui. Hoje, esse auxílio (até então moradia) é o que me mantém sobrevivendo enquanto faço o curso”, comenta.

Por ter concluído o ensino médio em 2013, o estudante teve de se adaptar a uma nova rotina de estudos para acompanhar os conteúdos e o ritmo da academia, visto que estava há um tempo afastado da sala de aula. “Quando entrei, tive uma certa dificuldade em acompanhar e absorver conteúdos dos quais nunca tive contato na vida e já era de conhecimento básico para grande parte dos colegas, então ir pegando aquele ritmo, saber como era estudar de um modelo diferente do que é na escola pública, foi uma coisa que só o tempo foi maturando e até perdi certos conteúdos no começo do curso por essa 'inexperiência'”, relembra.

A Universidade de Pernambuco (UPE) também foi consultada, pelo LeiaJá, mas até o fechamento desta reportagem não informou os dados solicitados sobre a quantidade de universitários oriundos de escolas públicas.

Retenção e evasão

As IES oferecem mais recursos para garantir que a formação acadêmica seja finalizada por todos os estudantes. É o que aponta a dissertação de mestrado de políticas públicas de Marcela de Melo Soares Sales, pelo departamento de Ciência Política da UFPE, sobre a implantação e manutenção das políticas públicas na instituição. Além das cotas voltadas para estudantes de escolas públicas, pretos, pardos, indígenas e de baixa renda, as ações afirmativas da Universidade envolvem auxílio alimentação, auxílio transporte, bolsa de manutenção acadêmica, moradia estudantil, entre outras.

Um estudo realizado pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) afirma que alunos cotistas, mesmo apresentando rendimento igual ou superior aos não-cotistas, ainda têm dificuldades para realizar o curso devido às limitações financeiras. A taxa de evasão desses alunos é parecida com a dos estudantes aprovados por ampla concorrência, e muitos deles têm de conciliar estudos com trabalho para se manter na universidade.

No entanto, já existem iniciativas das próprias instituições para garantir que esses estudantes consigam realizar toda a graduação de forma satisfatória. “Nós temos uma evasão em torno de 20% ao ano, que é um número compatível com as instituições públicas de ensino superior, que são as instituições que possuem menos evasão na educação superior do País”, afirma a professora doutora Maria do Socorro de Lima, pró-reitora de ensino de graduação da UFRPE. 

Segundo Kátia Cunha, diretora de gestão acadêmica da UFPE, é fundamental pensar em formar os estudantes dentro do tempo estipulado, evitando a desistência do curso. “Qualquer taxa de evasão é preocupante, mas a UFPE tem desenvolvido políticas de combate à evasão e fortalecimento da permanência dos estudantes. A primeira ação foi a criação de uma coordenação de permanência, reuniões semestrais com os coordenadores de curso, com a análise de índices e proposições de enfrentamento do problema”, ela ressalta.

A diretora ainda apresenta algumas das iniciativas que a Pró-Reitoria de Graduação (Prograd) tem para garantir a retenção. “Na Prograd temos alguns programas como residência pedagógica, o Programa de Educação Tutorial (PET), o Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (Pibid), monitoria, editais de apoio à coordenação, entre outros. Existem programas específicos junto à Pró-Reitoria para Assuntos Estudantis, que desenvolve políticas próprias para estudantes vulneráveis”, explica Kátia Cunha.

A professora Maria do Socorro também comenta a atuação dos programas na UFRPE. “Em relação aos estudantes de escola pública e de ampla concorrência, nós temos várias políticas institucionais que garantem a permanência desses estudantes na universidade. Essas políticas de assistência estudantil são para que o estudante entre, permaneça e se forme no tempo certo”, explica. A pró-reitora ainda ressalta que os programas de assistência estudantil ajudam a manter o estudante na graduação muito mais do que os que ingressaram por ampla concorrência. "Os estudantes que têm assistência estudantil, que são os de escola pública, de recorte social, são os que menos evadem na nossa instituição. Então, a evasão do estudante que tem assistência estudantil é infinitamente menor do que as evasões de ampla concorrência. O estudante de ampla concorrência, que vem de escola privada, evade  muito mais rápido, muda de curso ou de instituição”, ela finaliza.

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