Planalto ofereceu cargos pela morte de ex-PM, diz irmã

O ex-policial militar Adriano Magalhães da Nóbrega, envolvido na “rachadinha” do gabinete do senador Flávio Bolsonaro, foi assassinado em fevereiro de 2020

qua, 06/04/2022 - 19:35

Uma escuta telefônica feita pela Polícia Civil do Rio de Janeiro, há dois anos, mostra uma irmã do ex-policial militar Adriano Magalhães da Nóbrega, acusando o Palácio do Planalto de oferecer cargos comissionados em troca da morte do ex-capitão. 

No conteúdo, Daniela Magalhães da Nóbrega afirma a uma tia, dois dias após a morte do irmão numa operação policial na Bahia, que ele soube de uma reunião envolvendo seu nome no Palácio, e do desejo que se tornasse um “arquivo morto”. 

“Ele já sabia da ordem que saiu para que ele fosse um arquivo morto. Ele já era um arquivo morto. Já tinham dado cargos comissionados no Planalto pela vida dele, já. Fizeram uma reunião com o nome de Adriano no Planalto. Entendeu, tia? Ele já sabia disso, já. Foi um complô mesmo”, contou, em gravação autorizada pela Justiça. 

Morto em 9 de fevereiro de 2020, Adriano passou mais de um ano foragido sob a acusação de comandar a maior milícia do Rio de Janeiro. Ele também era suspeito de envolvimento no esquema da “rachadinha” no antigo gabinete do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) na Assembleia Legislativa Fluminense. 

A gravação faz parte das escutas realizadas pela polícia no âmbito da Operação Gárgula, que miraram o esquema de lavagem de dinheiro e a estrutura de fuga de Adriano. 

A polícia ouviu conversas de familiares, amigos e comparsas de Adriano por mais de um ano. Daniela, por sua vez, não é acusada de envolvimento nos crimes do irmão.  

A conversa sobre o Planalto foi feita com a tia dois dias depois da morte do irmão, num suposto confronto com policiais militares no interior da Bahia. Desde aquele dia, a família suspeita de uma execução para “queima de arquivo”, o que não foi comprovado até o momento. 

“Ele falou para mim que não ia se entregar porque iam matar ele lá dentro. Iam matar ele lá dentro. Ele já estava pensando em se entregar. Quando pegaram ele, tia, ele desistiu da vida”, afirmou Daniela. Pouco depois, a tia comenta com Tatiana, outra irmã de Adriano: “Daniela sabe de muita coisa, hein?”.

As suspeitas pela morte do ex-PM foram levantadas pelo próprio presidente Jair Bolsonaro (PL), dias após a ocorrência na Bahia. Ele e Flávio defenderam uma perícia independente para analisar o caso. 

A atuação de Bolsonaro foi alvo de elogio de Tatiana em uma outra conversa. “Ele foi nos jornais e colocou a cara. Ele falou: “

‘Eu estou tomando as devidas providências para que seja feita uma nova perícia no corpo do Adriano’. Porque ele só se dirige a ele como Adriano, capitão Adriano”. 

Ela também sugere que a ordem para matar o irmão foi do ex-governador Wilson Witzel. “Foi esse safado do Witzel, que disse que se pegasse era para matar. Foi ele”, pontuou. 

Foi possível analisar pelas escutas que, na avaliação da família de Adriano, ele era acusado de integrar uma milícia apenas para vincular o presidente aos grupos paramilitares. Tatiana, por sua vez, enfatiza ao negar a acusação feita ao irmão, a quem classifica como bicheiro. “Pessoal cisma que ele era miliciano. Ele não era miliciano, não. Era bicheiro. Querem pintar o cara numa coisa que ele não era por causa de coisa política porque querem ligar ele ao Bolsonaro. Querem ligar ele a todo custo ao Bolsonaro”. 

“Aí querem botar ele como uma pessoa muito ruim para poderem ligar ao Bolsonaro. Já disseram que foi o Bolsonaro quem assassinou. Quando a gente queria cremar, diziam que a família queria cremar rápido porque não era o Adriano. Uma confusão”. 

O vínculo de Bolsonaro com Adriano é desde 2005, quando, num discurso na Câmara dos Deputados, Bolsonaro criticou a condenação do então tenente da PM pela morte de um flanelinha numa operação policial. 

Em 2007, a então mulher do ex-PM, Daniella Mendonça, foi empregada no gabinete de Flávio Bolsonaro na Assembleia do Rio. Já em 2016, foi a vez do próprio Adriano assumir um cargo no mesmo lugar. As duas são acusadas de envolvimento no caso da “rachadinha”.

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