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Essa até podia ser uma história triste, se o amor dos pais pelo filho não convertesse a angustia em superação. Júlio Gomes/LeiaJáImagens

Nem uma doença genética rara conseguiu romper a união de uma família. Os pais de Francisco, de 6 anos, descobriram a condição pouco depois do seu nascimento e, nesta quarta-feira (15), comemoram o Dia Mundial da Hemofilia, exaltando a qualidade de vida e o bem-estar do filho. Eles garantem que a liberdade para uma rotina distante das sequelas só foi adquirida com o tratamento feito em casa.

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A banheira com sangue

“Você pode no mais simples dos acidentes, morrer”, explicou o diretor de Produtos Estratégico e Inovação da Empresa Brasileira de Hemoderivados e Biotecnologia (Hemobrás) Antônio Lucena. Sem cura, a hemofilia faz com que os pacientes demorem mais a estancar um sangramento, independente da intensidade da lesão. Hemorragias externas e internas - sobretudo nas articulações - são inevitáveis em um organismo com dificuldades na produção do Fator VIII recombinante, umas das proteínas necessárias para a coagulação sanguínea. "Têm dias que ele acorda sem pôr o pé no chão ou sem querer mexer o braço. A gente já sabe que tem um sangramento por ali", contou a advogada Priscila Vidal, mãe do pequeno Francisco. Essencialmente hereditária, a hemofilia tipo A é a mais recorrente e atinge um em cada 10.000 homens; Francisquinho é mais um dos 464 hemofílicos de Pernambuco que consegue vencê-la diariamente como um super-herói, pelos olhos da irmã Clarinha, de três anos.

Durante um banho aos seis meses, o menino deu seu primeiro alerta aos pais. Com as águas da banheira manchadas de sangue após um golfo, a mãe percebeu que o filho estava doente. Com o susto, foi-lhes recomendado uma hematologista e após o complexo exame de Cascata de Coagulação veio o diagnóstico da hemofilia tipo A, ou seja, Francisco tem menos de 1% de fator recombinante no corpo. Porém, a confirmação foi obtida ainda durante a coleta, devido a intensa hemorragia em seu braço. "Já era meio que a prova que ele tinha hemofilia", contou o gerente de projetos Tiago Vidal, pai do garoto.

Mesmo atentos, só depois da análise do resultado foi percebido alguns detalhes diferentes no filho, como o umbigo que demorou a cair e as equimoses que apareciam do nada em seu corpo. "A gente foi ligando as coisas e vendo que fazia sentido. Daí, começamos a pesquisar e mergulhar no universo da hemofilia", relembrou Tiago. Por Francisco, o casal tornou-se pesquisador do assunto com o objetivo de traçar uma terapia que garantisse uma rotina tranquila baseada no amor.

Devidamente protegido, o menino levado é o super-herói da irmã. Júlio Gomes/LeiaJáImagens

A profilaxia e o início de uma vida plena

Há aproximadamente três anos, em dias alternados, Francisquinho recebe o fator recombinante VIII que lhe falta através de um acesso na mão esquerda. O tratamento, também conhecido como profilaxia, faz com que o corpo mantenha pelo menos 30% do nível comum, o que evita sangramentos espontâneos. "Traz segurança para uma vida plena. A gente só pode ter esse dia a dia por conta do tratamento. Ele pula, brinca, corre", afirmou o pai sobre os benefícios da medicação, enquanto a esposa brinca, "se machuca também".

Com o aprimoramento da tecnologia dos remédios à base de sangue ou plasma, "o hemofílico já não precisa ter sequelas para ser tratado. Fazemos um tratamento contínuo, e isso faz com que o paciente tenha uma qualidade de vida comparada a uma pessoa comum", reiterou o diretor da Hemobrás, ao comentar sobre as dificuldades que outrora vinham da desinformação. Desgastado, o casal não aguentava mais figurar o hemocentro, quando Priscila conseguiu uma vaga para o curso de profilaxia domiciliar oferecido pela Fundação de Hematologia e Hemoterapia de Pernambuco (Hemope). "Ela pega ele se mexendo, é craque!", brincou Tiago, ao citar a habilidade da esposa; já que ela comanda a aplicação, enquanto ele fica responsável pela preparação, geralmente auxiliado por Clarinha.

Com um sentimento tão raro quanto sua condição, sempre que Francisco recebe o fator, ouve as explicações dos pais. Tanto que ele tem consciência do que pode ou não fazer e evita atividades de contato físico na escola em dias que não foi medicado. "Quando se machuca, ele já diz: 'mamãe, dá o fator'. Ele tem a consciência de que a gente consegue levar para ele esse benefício. É um desafio para qualquer mãe, mas a gente consegue vencer", relatou.

Os hemoderivados deram liberdade a Francisco

A partir do tratamento preventivo feito pela própria mãe, os pais já classificam Francisco como "virado", enquanto ele curte o prazer de ser criança jogando futebol, brincando de corrida ou até mesmo de bicicleta. "Temos confiança no tratamento. A gente sabe que o que aparecer, vamos driblar", relatou a mãe, que continuou, "às vezes a gente até se emociona quando vê ele descendo de escorrego, correndo e até caindo. Mas continuando e dizendo pra gente que tá tudo bem e quando se machucar, resolve com o fator. Isso é muito gratificante, ver ele ativo".

A rotina do tratamento sem dúvidas reafirma o elo entre a família e permite que Francisquinho planeje um futuro. O que antes era angustiante, com as idas ao hemocentro, foi metamorfoseado em união e afeto. Cada gota de sangue é tão importante quanto cada momento vivido. Assim, a Família Vidal vive dia após dia com a certeza de que uma história de superação começou a ser escrita.

Antônio Lucena acredita em um futuro positivo na cura da hemofilia no Brasil, “temos células para trabalhar pelo menos 100 anos. Daqui há 100 anos, essa tecnologia já foi ultrapassada e a gente vai estar, certamente, corrigindo a hemofilia no feto. Não deixando que ele nasça com esse tipo de problema”, finalizou.

O diretor da Hemobrás exalta o trabalho de parceria realizado com os hemocentros. Júlio Gomes/LeiaJáImagens

Suporte oferecido pelo Estado

Os hemoderivados chegam aos pacientes através das políticas públicas do Ministério da Saúde, como o Programa Nacional da Hemofilia e a Parceria de Desenvolvimento Produtivo (PDP) entre a Hemobrás e um laboratório internacional. Como o medicamento é produzido fora o país, a PDP permite que até 2023 - ano previsto para a inauguração da fábrica própria em Goiana, Região Metropolitana do Recife, em Pernambuco - a tecnologia do laboratório seja transferida à empresa nacional, para que o produto seja fabricado no Brasil. É estimado que essa parceria tenha economizado R$ 5,2 bilhões para o Sistema Único de Saúde (SUS).

Com o fornecimento da Hemobrás, cabe aos hemocentros espalhados pelo país repassar o produto aos pacientes. Só no ano passado, o Hemope - principal hemocentro de Pernambuco - forneceu 40.357 milhões de UIs (Unidades internacionais) do Fator VIII à população. Atualmente, o Brasil tem um padrão de fornecimento de medicamentos hemoderivados comparável ao dos países desenvolvidos.

Nesta quarta-feira (17), unidades de saúde e laboratórios festejam em prol da conscientização e reacendem a luta pelos direitos dos hemofílicos. "Esse dia é um marco, onde é celebrado o reconhecimento de onde chegamos. É quando a gente lembra do passado, para tentar não voltar a ele e continuar na busca por melhorias, garantindo o que a gente tem hoje", explicou o diretor da Hemobrás. No Recife, capital pernambucana, a programação ocorre na sede do Hemope, localizada na Rua Joaquim Nabuco, nº 171, no bairro das Graças, Zona Norte do Recife. No local, está prevista uma manhã de palestras, lanche e muita diversão com recreação para as crianças.

Pelo menos 43 pessoas morreram na Venezuela desde 2016 por falta de tratamento para a hemofilia, uma doença cuja mortalidade caiu drasticamente na maior parte do mundo, denunciaram duas ONGs nesta sexta-feira.

A metade dos mortos eram crianças que não puderam acessar os medicamentos necessários para controlar a doença, detalhou Antonia Luque, presidente da Associação Venezuelana de Hemofilia (AVH), em uma coletiva de imprensa.

"É necessário que o Estado aceite a abertura de um canal humanitário" para a entrada dos coagulantes sanguíneos e demais fármacos requeridos, apontou a ativista.

Estima-se que na Venezuela cerca de 5.000 pessoas padecem de hemofilia e outros transtornos de coagulação, das quais 212 se encontram em "situação crítica", acrescentou.

De acordo com Luque, cerca de 60 dessas pessoas se viram obrigadas a sair do país para receber tratamento, especialmente para Colômbia, Peru, Equador e Argentina.

"Não só temos falta de medicamentos para tratar as doenças crônicas, como estamos lutando contra a deterioração dos centros hospitalares, a escassez de insumos e a diáspora de profissionais especializados" com a migração de médicos, acrescentou Luque.

Na mesma entrevista coletiva, César Garrido, representante no país da Federação Mundial de Hemofilia, contrastou a situação dessa doença na Venezuela com a do resto do mundo.

"Recebemos notícias positivas de todo o mundo, com exceção da Venezuela. Não conheço nenhum país em que morram pacientes por falta de tratamento", afirmou.

Apesar de ter atingido o estoque do Governo Federal de medicamentos para tratamento de hemofilia, o incêndio da última terça (16), no Cabo de Santo Agostinho, não irá comprometer o abastecimento de fármacos no país. As informações são da Federação Brasileira de Hemofilia (FBH).

De acordo com Guy Joseph Bruène, gerente de Plasma e Hemoderivados da Hemobrás, o abastecimento está garantido para os próximos seis meses e, em caso de necessidade, será possível aumentar os estoques. Dessa forma, pacientes e cuidadores poderão continuar o tratamento com o Fator VIII, medicamento cujo estoque foi atingido pelo fogo, sem interrupções.  O remédio é responsável por inibir as hemorragias internas e externas de pessoas hemofílicas, que sofrem um tipo de problema na coagulação do sangue. 

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“Não é necessária preocupação, pois o incêndio não irá afetar o abastecimento e consequentemente os tratamentos de profilaxia, que atua na prevenção dos sintomas e também nas doses domiciliares de pessoas e crianças com hemofilia”, informa a gerente.

Com informações da assessoria

Quando viver passa a ser um constante alerta em relação ao seu próprio sangue. Cortes superficiais, feridas e lesões no corpo podem acarretar sangramentos inesperados. Apesar de atingir mais de 12 mil brasileiros (dados de 2012 do Ministério da Saúde), a hemofilia, descoberta em 1828, ainda é uma enfermidade pouco popularizada no País.

Genético-hereditária, a doença é lembrada nesta quinta-feira (17), Dia Mundial da Hemofilia. Caracterizada por uma alteração no cromossomo X, a enfermidade impossibilita a coagulação normal do sangue, manifestando-se quase exclusivamente nos homens, em níveis de gravidade diferentes. Hematomas e sequelas nos membros podem ser consequências da enfermidade.

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“Ainda pequeno, quando tinha dois anos, dormindo por cima da chupeta, fiquei com um hematoma no rosto. Como tenho tio e primos hemofílicos, foi mais fácil entender o que era”, contou Maurício Spinelli, que é produtor cultural e assessor de comunicação.  “Passei a vida tendo que ter cuidado com sangramentos, pancadas e hematomas. Além de combater o preconceito de algumas pessoas a minha volta”, admitiu, ao dizer que a doença não o impede de exercer suas profissões e lutar pela comunidade hemofílica em Pernambuco. 

Na concepção de Spinelli, a principal dificuldade ainda é a social, motivada pela falta de informação e preconceito das pessoas. No ano de 2013, a Casa do Hemofílico, no bairro da Encruzilhada, chegou a fechar as portas, mas com intervenção política e de organizações não governamentais o local voltou a funcionar. Os hemofílicos tratam a enfermidade com injeções periódicas dos fatores 8 e 9, responsáveis pelo estancamento sanguíneo. 

“É incomum perdermos paciente para a hemofilia, pois há o tratamento e os pacientes se previnem. Mesmo aqueles que sofrem traumatismo craniano, e o sangramento é bem maior, não é frequente ocorrer mortes”, afirmou a hematologista do hospital Santa Joana, Érika Coelho. Mesmo assim, na concepção da especialista, pouco é feito pelo governo federal e estadual em prol da conscientização sobre a doença para pacientes e familiares. “Em todo o mundo há orientação para as mães administrarem a infusão do fator nas crianças. Na saúde pública brasileira ainda é complicado”. 

Para Maurício Spinelli, não cabe apenas ao governo as ações para a hemofilia. “É uma responsabilidade coletiva, dos familiares, dos médicos e das pessoas envolvidas. Na minha época não existiam os programas e as facilidades que existem hoje. Eu enxergo que avançamos muito e acredito que vamos avançar muito mais”, observou. 

Todo cuidado é pouco - Em risco constante de serem acometidos por hemorragias, os hemofílicos precisam se prevenir e evitar atividades potencialmente “perigosas”, como esportes radicais. Na população de baixa condição financeira, Érika Coelho diz ser visível a manifestação mais aguda da doença. “Muitos mancam, os membros atrofiam e as sequelas são mais visíveis. Se não cuidar logo, a gravidade aumenta. É preciso orientar essas pessoas”. 

Cientistas anunciaram nesta terça-feira (19) ter tratado a hemofilia em cães acertando um gene defeituoso, o que representou um avanço no tratamento desta disposição congênita em humanos também.

A hemofilia A, a forma mais disseminada da doença sanguínea hereditária, afeta um em cada 10 mil homens. Ela se dá na presença de um gene defeituoso, passado por linhagem materna, que causa deficiência em uma proteína coagulante denominada Fator VIII.

Atualmente não há cura. O sangramento sem controle é tratado com injeção coagulante, embora o sistema imunológico de alguns pacientes possa reagir a ela. Uma equipe de cientistas chefiada por David Wilcox, da Escola Médica de Wisconsin, em Milwaukee, usou um vírus como um microscópico Cavalo de Tróia em testes com cães.

Eles esconderam uma versão ativa de um gene chamado ITGA2B em um vírus inofensivo. O vírus foi, então, usado para "infectar" três cães com hemofilia A, inserindo o gene sadio em células-tronco que fazem plaquetas ou minúsculos fragmentos de células que coagulam o sangue.

Dois dos cães que produziram os níveis mais elevados de Fator VIII depois do tratamento não apresentaram episódios de sangramento severo durante toda a duração do estudo, de dois anos e meio. Segundo o estudo, publicado na revista Nature Communications, nenhum dos três cães precisou de medicamentos para suprimir seu sistema imunológico após receberem o novo gene.

A terapia genética se baseia na ideia de que doenças hereditárias podem ser combatidas encaixando-se genes funcionais para substituir defeituosos. Ela estourou na cena médica no final dos anos 1990 e é uma das áreas mais promissoras da biotecnologia, teoricamente oferecendo a promessa de bloquear ou reverter as doenças hereditárias.

Mas esta nova fronteira também tem sido alvo de alguns reveses, notavelmente uma resposta inesperada e incontrolável do sistema imunológico. Até agora, os sucessos têm sido poucos, limitados a distúrbios em um único gene, ao contrário dos complexos distúrbios multigenéticos presentes nas doenças mais comuns.

Em julho, cientistas na Itália disseram ter tratado seis crianças com leucodistrofia metacromática, uma doença do sistema nervoso que é causada por mutações do gene ARSA. Os reveses também incluíram a morte de um voluntário americano de 18 anos, Jesse Gelsinger, em 1999, e o desenvolvimento de câncer em duas crianças francesas tratadas com uma síndrome provocada pela falta crônica de defesas imunológicas.

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