O nome Capibaribe ou Caapiuar-y-be vem da língua tupi e significa rio das Capivaras ou dos porcos selvagens. Nasce na serra do Jacarará, município de Porção, entre as divisas do estado de Pernambuco e a Paraíba. O rio Capibaribe tem um curso de 250 quilômetros e uma bacia de quase 6 mil quilômetros quadrados. Apesar de contribuir para o crescimento socioeconômico do Estado de Pernambuco e do Nordeste, hoje o Capibaribe está poluído por dejetos orgânicos, coberto de lama, assoreado e quase sem vida.
Ele possui pouco mais 74 afluentes, passa por 42 municípios pernambucanos, entre eles: Toritama, Santa Cruz do Capibaribe, Salgadinho, Limoeiro, Paudalho, São Lourenço da Mata e o Recife. Para o biólogo e Presidente do Comitê da Bacia Hidrográfica do Capibaribe, Ricardo Braga, essa degradação está diretamente ligada aos esgotos domiciliares.
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''Hoje a grande causa da poluição do Rio Capibaribe é o esgoto das cidades. Nós fizemos um trabalho no ano passado, com dez escolas, crianças e adolescentes, desde a nascente em Santa Cruz do Capibaribe até o Recife. Elas fizeram coleta de água e a análise dessas águas mostraram que a quantidade de coliformes fecais que, são indicadores de esgoto doméstico, aumentou muito após cada cidade, um dado extremamente preocupante'', alerta Braga.
Zeniltom Tomé, conhecido como “Seu Mita”, tem um carinho especial com o Capibaribe, afinal, já se vão mais de 30 anos transportando pessoas de um lado para o outro do rio em um pequeno barco, no bairro da Torre. Ele cobra dois reais por passageiro, dinheiro que já garantiu a faculdade de dois filhos e o sustento da família por mais de três décadas. Seu Mita se lembra com saudade dos tempos em que o rio era limpo.
''Quando garoto eu tomava banho aqui sem problema nenhum. Era só alegria. Hoje vejo com tristeza o que fizeram com o Capibaribe. O lixo desce pelo rio a todo o momento. Aqui passa cavalo, porco, gado, cachorro, tudo boiando. O povo podendo enterrar, chamar a saúde pública. Porque é o povo que faz isso, gente que mora na beira do rio, e olha que tem muito morador de prédio, pessoas que deveriam ter consciência, mas não, preferem jogar o lixo no rio do que depositar na frente da casa. Cadê as autoridades? O rio está morrendo gente'', fala com tristeza.
Dedicação e zelo com o Capibaribe é sinônimo de Maria do Socorro. Há 18 anos mantém o Capibar, um espaço no bairro de Casa Forte, as margens do rio, decorado com o lixo que antes boiava nas águas do Capibaribe. O trabalho de Socorro não se resume apenas em coletar o lixo e expor. Ela tem uma estratégia pessoal e ousada para tocar seu comércio.
''Este espaço que nós temos não se resume a apenas um bar. Uma parte do lixo que recolhemos, serve para ficar exposto: como; ventiladores, geladeiras, televisores, capacetes de moto e uma infinidade de objetos que são lançados do rio. Ele tem uma grande parcela de informação para as pessoas que aqui vem. Muita gente fica assustada com a quantidade de lixo que vem do rio e acaba virando arte. É uma forma de disser, você também precisa fazer sua parte, não jogue lixo no rio. Afinal, não é o Capibaribe que precisa do Recife, é o Recife que precisa dele, se o Capibaribe parar o Recife morre '' enfatiza Maria do Socorro.
No dia 24 de agosto de 2013, Maria do Socorro foi surpreendida pela fiscalização da Diretoria de Controle Urbano do Recife (Dircon). ''Eles chegaram aqui exigindo o alvará de funcionamento do bar. Ora, onde estamos faz parte das Zonas Especiais de Interesse Social - ZEIS - que são áreas de assentamentos habitacionais de população de baixa renda. A Zeis me garante moradia e trabalho, já que não possuo escritura da terra. Continuo com o espaço aberto. Nós recebemos, das 8h às 14h, escolas, universidades e pesquisadores, a entrada são 2 kg de alimentos ou 5 reais. Com este dinheiro, faço o trabalho de educação ambiental e continuo retirando o lixo do Rio'', esclarece Socorro.
Trabalho voluntário que começou há 19 anos, quando Maria do Socorro criou junto com a comunidade, o Recapibaribe é uma Organização não governamental que está ajudando a mudar a face do rio. E os resultados já começam a aparecer.
“De 1999 a 2000 nós tiramos 600 toneladas de lixo, com as mãos, com barcos de madeira, com uma coleta manual sem ter nenhum apoio. Este espaço que nós temos, tem uma grande parcela de informação para as pessoas que aqui vem. Em agosto, saímos novamente com 71 pescadores e 58 barcos. Após percorrer 8 km no rio, conseguimos retirar 3 toneladas de lixo do Capibaribe. Eu acredito que o rio não é feio. Mesmo com o descaso que está ai, ele brilha, ilumina a cidade, é o Capibaribe dos nossos sonhos'', fala Socorro, emocionada.
Transformar o Capibaribe num rio limpo e navegável é o sonho de muita gente. O arquiteto suíço Julien Ineichen, é um exemplo. Ao visitar o Brasil, em 2005, para realizar um trabalho na comunidade Chico Mendes, ficou chocado com o descaso e a falta de cuidado da população com o seu rio. Em 2007, decidiu morar em Olinda e começou a pensar numa forma de conscientizar as pessoas da necessidade de proteger suas águas.
''Logo que cheguei no Recife, vindo da Suíça, morto de calor, e vendo o Capibaribe logo pensei, eu não posso usufruir do rio, já que ele está totalmente poluído. Percebi que o esgoto é despejado sem tratamento no rio, e ninguém fazia nada. Criei então um projeto chamado 'Quero nadar no Capibaribe, e você ?', que visa melhorar a qualidade da vida na cidade. Todos nós somos responsáveis pela qualidade da água do rio. Fazemos um trabalho de conscientização das pessoas através da mídia. Também fazemos um trabalho nas escolas. Cada um fazendo sua parte, com certeza teremos uma qualidade de vida melhor para futuras gerações'', diz Ineichen.
Em janeiro deste ano, a Secretaria das Cidades divulgou o projeto de navegabilidade do Capibaribe, que propõe a implantação de um sistema integrado de transporte de passageiros no rio, foi aprovado pelo PAC da Mobilidade e terá investimento de R$ 289 milhões. Projeto que começou a sair do papel com a assinatura da ordem de serviço por parte do Governador Eduardo Campos no dia 13 de setembro, para a construção das estações de embarque e desembarque de passageiros, etapa que irá receber recursos na ordem de 94,5 milhões de reais
''Esse é um modal que vai melhorar a qualidade de vida da população do Recife e Região Metropolitana. Vamos melhorar a mobilidade, ter um transporte seguro, integrar a outros meios de transporte como o ônibus, e principalmente resgatar este meio de locomoção que desapareceu ao longo do tempo'' explicou o governador.
Inicialmente, serão 13 barcos de transporte, com capacidade para 89 pessoas cada, com estimativa para transportar 300 mil passageiros por mês. A rota Oeste deve ser percorrida em cerca de 40 minutos, com intervalos de saída de 10 minutos entre um barco e outro.
''A gente vê o rio das pontes da cidade. Precisamos aproximá-lo das pessoas novamente. O recife é cortado por rios, não podemos esquecer a mobilidade fluvial e a recuperação do Capibaribe'', disse o prefeito Geraldo Júlio.
A primeira etapa do Programa Rios da Gente, que visa resgatar a navegabilidade no Capibaribe, dragou em seis meses, mais de 160 metros cúbicos de lixo retirados do rio, o que enche de esperança o Secretário de Meio Ambiente e Sustentabilidade de Pernambuco Sérgio Xavier.
''A navegabilidade é um ponto de inflexão importante, porque a navegabilidade vai permitir o uso e uma conivência com ele, que nunca aconteceu nos últimos anos na nossa capital e na região metropolitana do Recife. Vai permitir que as pessoas usem o rio no seu transporte, permitir que elas conheçam melhor o Capibaribe, aprendam a amar e protegê-lo. Vai ser um ponto positivo em relação ao futuro'', se mostra confiante o secretário.
Sanear, tratar, isso tem sido o lema de muitas entidades e projetos. As ações de governos, e entidades da sociedade civil, são importantes e necessárias para manter viva a esperança de sobrevida do Capibaribe.
''Temos hoje um plano hidroambiental do Rio Capibaribe que foi elaborado durante um ano, com a participação do comitê da bacia do Capibaribe e Governo do Estado, que aponta para cenários muito melhores, desde que os 24 projetos previstos sejam implantados. Também existe um plano de sustentabilidade hídrica que já começou a ser implantado com recursos do banco mundial para os principais municípios por onde passa o rio, que são fontes de esgoto doméstico, sejam saneados. Então há uma possibilidade que não é fictícia para que tenhamos uma melhor qualidade de água deste rio tão importante para nosso Estado. Tenho esperança sim'', diz confiante o presidente da bacia do Rio Meia Ponte Ricardo Braga
Esperança também compartilhada por Maria do Socorro ''Eu acredito que se houver união entre, sociedade civil, governo e municípios, podemos tirar o Capibaribe da situação em que se encontra. Afinal o rio brilha, é como se dissesse para nós. Eu sou o coração, eu estou presente, será que vocês não percebem'', finaliza.
Diagramação: Clarissa Trevas
Fotos: Álvaro Duarte